O RISCO CARDIOVASCULAR NA CONSULTA DE PLANEAMENTO FAMILIAR

Autores

  • Raquel Baptista Leite Interno de Medicina Geral e Familiar, Unidade de Saúde Familiar (USF) São Martinho de Alcabideche – ACES de Cascais
  • Catarina Ferreira Moita Interno de Medicina Geral e Familiar, Unidade de Saúde Familiar (USF) São Martinho de Alcabideche – ACES de Cascais
  • João Pires Interno de Medicina Geral e Familiar, Unidade de Saúde Familiar (USF) São Martinho de Alcabideche – ACES de Cascais
  • Ana Amorim Assistente em Medicina Geral e Familiar, USF São Martinho de Alcabideche – ACES de Cascais
  • Ana Paes de Vasconcellos Assistente em Medicina Geral e Familiar, USF São Martinho de Alcabideche – ACES de Cascais
  • Ana Dantas Assistente em Medicina Geral e Familiar, USF São Martinho de Alcabideche – ACES de Cascais

DOI:

https://doi.org/10.58043/rphrc.5

Palavras-chave:

Obesidade, Planeamento familiar, Hipertensão Arterial

Resumo

Introdução: Importa reconhecer quando, em consulta, surgem novos e inesperados problemas clínicos que carecem de atenção e integração numa abordagem holística. O presente caso clínico tem como objetivos, por um lado, reforçar que a Medicina Geral e Familiar se distingue das restantes especialidades pela continuidade de cuidados que permite o acompanhamento longitudinal e integrado do doente, não isolando uma patologia ou um risco dos restantes antecedentes do doente; e, por outro lado, recordar que todas as especialidades devem ter presente na sua prática clínica estes riscos que não são independentes entre si.

Caso clínico: Sexo feminino, 42 anos, com antecedentes pessoais de obesidade classe I e coriocarcinoma em remissão. Medicada habitualmente com etinilestradiol + gestodeno, 0.03 mg + 0.075 mg, 1 comprimido/dia durante 21 dias com pausa de 7 dias. Nega hábitos etanólicos, tabágicos ou outros. Recorre a uma consulta programada de rotina. Ao exame objetivo apresentava peso de 86 kg, altura 167 cm com índice de massa corporal (IMC) de 30.84 kg/m2 (obesidade classe I) e uma pressão arterial média de três medições de 150/80 mmHg. Solicitou-se a auto-medição da pressão arterial em ambulatório reagendando-se consulta para 2 meses depois. Na consulta seguinte a doente trouxe o registo das tensões arteriais em ambulatório com valores de pressão arterial sistólica superior a 160 mmHg e pressão arterial diastólica superior a 90 mmHg, embora normocárdica. Ao exame objetivo, apresentava uma pressão arterial média de três medições de 180/100 mmHg, com um IMC sobreponível ao da consulta anterior e um SCORE de risco cardiovascular baixo (< 1%). Fez-se diagnóstico de hipertensão arterial de grau 2/3 (com base nos registos em ambulatório e na consulta) e optou-se por iniciar lisinopril + amlodipina, 20 mg + 5 mg, 1 comprimido/pequeno-almoço. Foram pedidos meios complementares de diagnóstico direcionados ao estudo da etiologia da hipertensão arterial, que se revelou uma hipertensão arterial essencial, e suspendeu-se o contracetivo oral combinado, pelo risco cardiovascular acrescido, tendo-se optado pela colocação de um dispositivo intrauterino com levonorgestrel.

Discussão: Apesar de existir evidência de que a obesidade aumenta a metabolização hepática de fármacos e a absorção de contracetivos pelo tecido adiposo, resultando na necessidade de maiores doses para alcançar nível terapêutico, não existe indicação para adaptar o aconselhamento contracetivo em mulheres obesas sem outras comorbilidades conhecidas, podendo prescrever-se contraceção hormonal combinada. Porém, perante a presença de hipertensão, esta passa a ser uma contraindicação absoluta, sobretudo quando associado a outro fator de risco para doença cardiovascular, nomeadamente idade superior a 35 anos, tabagismo superior a 15 cigarros por dia ou dislipidemia. Perante as comorbilidades da doente, optou-se pela colocação de um dispositivo intrauterino com levonorgestrel. O presente caso clínico revela que a Medicina Geral e Familiar se distingue das restantes especialidades pela continuidade de cuidados que permite o acompanhamento holístico do doente, não isolando uma patologia ou risco dos restantes antecedentes do doente, garantindo-se assim uma abordagem interdisciplinar e integrada do doente.

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Referências

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Publicado

2022-05-10

Como Citar

1.
Baptista Leite R, Ferreira Moita C, Pires J, Amorim A, Paes de Vasconcellos A, Dantas A. O RISCO CARDIOVASCULAR NA CONSULTA DE PLANEAMENTO FAMILIAR. RH [Internet]. 10 de Maio de 2022 [citado 21 de Dezembro de 2024];(87):30-3. Disponível em: https://revistahipertensao.pt/index.php/rh/article/view/5

Edição

Secção

Caso Clínico